terça-feira, 1 de setembro de 2009

O MENINO VOADOR

Era uma vez um menino. Ele tinha um segredo. A mãe dele dizia para
ele não contar o segredo dele para ninguém. E ele não contava.
O primeiro segredo dele era o seguinte: desde que ele tinha cinco anos
que tinha nascido asas brancas de voar nas costas dele.
A mãe e o pai
diziam para ele que era melhor ninguém saber, pois poderiam levá-lo
para o circo e então seria muito ruim viver no meio dos elefantes e macacos fazendo gracinhas.
O menino obedecia e não tomava banho na frente de ninguém e também não ia à praia, nem à piscina e nem ao rio nadar, pois alguém poderia descobrir o segredo que ele guardava a sete chaves.
Quando completou a idade de onze anos, o menino começou a prestar muitos pássaros que voavam lá no céu. E muitos pensamentos vinham e ficavam na cabeça do menino. Chegou a ficar com dor no pescoço de tanto olhar para o céu.
Um dia, quando ninguém estava em casa, o menino subiu na cadeira e bateu as asas para ver o que acontecia. Nada demais aconteceu a não ser que ele se estabacou no chão.
Essas asas não servem para nada, pensou. Mas continuou a olhar os pássaros e no outro dia esperou todos saírem e tentou de novo. Foi tentando, tentando, um pouquinho todo dia, até que, quando já estava quase desistindo, voou.
Voou pela sala e saiu pela janela e ficou tão feliz que foi voando e voando e viu a praia lá de cima e viu o colégio e viu outras cidades e viu outros mundos e ria, ria sozinho lá no alto do lado dos pássaros mais corajosos. Até eu teve vontade de fazer xixi e pensou: Será que os pássaros fazem xixi cá do alto? E o xixi dos pássaros? Cai na cabeça da gente? Sei lá, acho que é melhor voltar para casa. Mas quando pensou nisso pensou também que não sabia o caminho de volta, pois não havia prestado atenção e foi justamente nessa hora que começou a anoitecer. Então o menino chorou com saudades da mãe dele. Encontrou um ninho bem quentinho com uns passarinhos dentro e foi lá mesmo que dormiu. Sonhou que não tinha asas e que nada acontecia e acordou feliz. A mãe passarinha olhava para ele com uma cara desconfiada e piava: piu? O menino disfarçou mais que pôde e respondeu: piu.
A mãe passarinha saiu para buscar comida. Foi quando o menino aproveitou para tentar ir embora. Mas quando estava se afastando, eis que a mãe passarinha tinha voado atrás dele. Brava, bravíssima, bicou sua camisa e trouxe o menino de volta para o ninho. Lá chegando, olhou seriamente para ele e disse com muita raiva:
- PIU!PIUUUU!
O menino baixou os olhos e respondeu baixinho: pi.
Daí a mãe passarinha deu uma minhoca para ele comer e ele começou a chorar, pois não queria comer minhoca, mas estava com fome e com saudades de arroz com feijão.
No terceiro dia conseguiu escapar e saiu voando e tentando achar o caminho de volta. Voou, voou até que viu um morro de pedra lá longe e reconheceu o morro. Com certeza, morava perto dele. Voou na direção da pedra grande e foi se lembrando do caminho porque lembrava de prédios grandes que já tinha visto.
Foi ficando feliz à medida que tinha certeza que estava voltando. Quando finalmente conseguiu entrar pela janela, encontrou a família toda preocupadíssima procurando por ele.Contou a verdade e foi assim que todos – vizinhos, jornais, emissoras de televisão – ficaram sabendo que ele era um menino diferente, pois tinha asas e sabia voar.
O menino foi convidado para fazer anúncio de companhia aérea, saiu na capa de revista, virou personagem de novela e não teve mais sossego. A confusão piorou quando viu pela janela a mãe passarinha piando e chorando e olhando por todos os lados. Ficou tão desesperado que se escondeu debaixo da cama.
Sem saber como sair dessa situação, procurou a mula de uma cabeça e que disse para ele:
- Ih, foi muito difícil ser diferente.
Procurou a sereia da lagoa que disse:
- Eu quis ser diferente e desisti.
Procurou a bruxa chorona e a bruxa chorou.
Procurou por toda parte o fantasma amarelo, mas ele nunca foi visto em nenhum lugar. Ou seja, ninguém tinha uma solução para ele.
De noite ele ouvia o piado da mãe passarinha e morria de pena dela, mas mesmo assim se escondia debaixo da cama com medo de ter que comer minhocas.
E o pior de tudo é que ele não tinha desistido de voar e então, quando podia, escondidinho, sem ninguém ver, voava e voava. Morria de medo, mas voava assim mesmo. Quando via a mãe passarinha, fugia pois era muito mais rápido que ela.
Uma coisa boa aconteceu: ganhou tanto dinheiro trabalhando em comerciais de tevê que comprou uma casa bem grande para a família. No seu aniversário de quinze anos acordou leve. Foi se espreguiçar e então olhou para a cama e a cama estava cheia de penas. Correu para o espelho e constatou que não tinha mais asas para voar. Ouviu o piado triste da mãe passarinha e dessa vez não se escondeu, esperou por ela, mostrou as penas caídas e disse, sem saber exatamente o que estava dizendo: Mãe, piu, piu, piu? Piu..piu...
A passarinha sorriu e respondeu feliz: PIU!PIU!!
E saiu voando contente.
O menino também ficou contente, pois nunca mais teria que comer minhocas em sua vida. Também nunca mais saiu na tevê. A companhia aérea não o convidou mais para garoto-propaganda, mas mesmo assim ele ficou feliz.
Quando aconteceu o segundo segredo, esse ele não contou para ninguém. Até hoje ninguém sabe que, em vez de penas, das suas costas caem, todas as noites, moedinhas.

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