Era uma vez um fantasma amarelo. Toda noite ele comia manga até dizer chega e assim ganhava essa cor diferente que era o que mais aterrorizava os meninos. Mesmo os meninos que não tinham medo de alma de outro mundo, quando viam o fantasma amarelo, saíam correndo. Mas o seu segredo ele não contava para ninguém.
Esperava a luz do sol, pois gostava de assustar de dia, quando a maioria das pessoas não tem medoNem precisava dizer buuuuuuuuuuuu, era só aparecer na frente de uma criança que causava o maior terror. Ele adorava aterrorizar as crianças.
Geralmente esperava alguma passar por alguma trilha em algum país e simplesmente aparecia. O seu simples aparecimento fazia com que as crianças chorassem e gritassem. O fantasma amarelo morria de rir do susto dos outros. Quanto mais a criança chorava, mais o fantasma amarelo ria.
Ontem, pela quinta vez, assustou o mesmo menino, um guri de sete anos que usava uma camisa verde-amarela que há uma semana voltava para casa chorando e berrando e dizendo que tinha um visto um fantasma amarelo. O pobre menino já nem conseguia dormir de noite, de tanto medo que sentia. Mas quando o fantasma amarelo assustou o menino de camisa verde-amarela pela quinta vez, o menino se enfezou e prometeu a si mesmo que esse horror não podia continuar.
Preparou-se no sexto dia, saiu andando pela trilha pensando:
- Não vou me assustar, não vou me assustar, não vou me assustar.
Daí o fantasma amarelo apareceu. Daí o menino olhou para ele e continuou olhando. E enquanto o menino olhava para ele o fantasma tentava desaparecer, mas não conseguia, porque existe uma lei natural no mundo dos fantasmas que diz que um fantasma não consegue desaparecer se tiver alguém olhando para ele. Como geralmente as pessoas, adultos e crianças fecham os olhos e saem correndo, todo fantasma desaparece e reaparece fácil.
Sem saber disso, por puro acaso, o menino resolveu que não ia parar de olhar para o fantasma. O fantasma amarelo se enfureceu e disse:
-Buuuuuuuuuuuuuuuuu!
O menino continuou olhando.
O fantasma amarelo disse:
-Buáááááááááaááááááááááááááááá!!!!!!!
O menino continuou olhando.
Então o fantasma tentou desaparecer e não conseguiu. E tentou de novo e não conseguiu de novo. Furioso, o fantasma amarelo saiu correndo e o menino nem pensou no que estava fazendo. Por puro impulso, correu atrás.
Acontece que o fantasma não estava acostumado a correr. Comia manga a noite inteira, aparecia e desaparecia, assustava e ria e nunca fazia nenhuma ginástica. Logo logo se cansou. Já o menino era acostumado a correr, a andar de bicicleta, a apostar corrida com os amigos, a mergulhar na praia e nos riachos e por causa disso tinha uma energia sem fim. O menino nem se cansou, correu atrás do fantasma a tarde inteira. Quando o fantasma parava, o menino parava, mas nunca parava de olhar para o fantasma.
Exausto, o fantasma começou a sentir medo. E se esse capeta desse menino não me largar mais? E se eu não puder nunca mais desaparecer? Todos vão acabar se acostumando comigo e isso será horrível. Ninguém tem medo daquilo que está acostumado.
Enquanto isso, a família do menino estava desesperada pois ele não voltava para casa. Todos saíram para procurá-lo, o pai, a mãe, a tia, a irmã, o namorado da irmã, a madrinha, as avós, os avôs, as primas e o primo. Cada um saiu para um lado.
Quem encontrou o menino foi o primo dele, que também já tinha sido assustado pelo fantasma amarelo e que sabia do plano que o menino tinha de nunca mais sentir medo. Foi bom pois o menino estava com fome e pediu ao primo que vigiasse o fantasma amarelo enquanto ele ia em casa comer depois voltava. E assim fez. Não tinha ninguém em casa, pois todos estavam procurando os meninos, ou seja, o menino e o seu primo, que também tinha desaparecido.
Os dois meninos correram atrás do fantasma durante dois dias e repararam que o fantasma estava ficando branco.
O fantasma então sentiu tanta fome que resolveu revelar o seu segredo e pediu pelo amor de Deus que os meninos arranjassem manga para ele. Curiosos, os dois concordaram só para ver o que acontecia e viram. O fantasma foi ficando amarelo de novo, mas estava tão cansado e desapontado que fez um juramento. Jurou que nunca mais iria assustar nenhuma criança das redondezas desde que eles parassem de olhar para ele de modo que ele pudesse desaparecer. Mas quem iria acreditar em juramento de fantasma malvado? O primo do menino teve uma brilhante idéia e fez uma contraproposta. Ok, eles iriam parar de olhar para o fantasma. Mas antes queriam filmá-lo com uma câmera de vídeo. Dessa vez o próprio fantasma quem se aterrorizou:
- Uma câmera de vídeo?????
É pegar ou largar, disse o primo do menino, que era mais velho e tinha mais experiência com fantasmas. O fantasma não teve escapatória e concordou.
Enquanto o menino olhava o fantasma comendo manga, o primo dele foi em casa buscar a câmera e, para surpresa do fantasma, além da câmera trouxe a família toda: a prima que cantava queria aparecer no vídeo cantando junto com a mãe dele, pois ambas eram cantoras de nascença, o namorado da irmã dele queria reger pois o maior sonho da vida dele era ser maestro, o pai do menino trouxe um violão afinadíssimo, a avó trouxe um teclado pois era excelente pianista nas horas vagas, o avô aproveitou e disse que também ia sair no filme, que ia fazer uma palestra, a madrinha pediu para declamar, e a tia do menino, que trabalhava na tevê, começou a fazer as marcações de cena e iluminação e a mandar em todo mundo.
- Você chega um pouquinho mais para lá, você aí, penteia o cabelo, dá mais amarelo no fantasma, aumenta o som, isso, o agudo, segura o microfone, passa pó de arroz que a pele ta oleosa, você espera, você pode começar, corta! Vamos tentar de novo, um, dois, três e já, silêncio gravando... Agora valeu!
O fantasma ficou assustadíssimo com aquilo tudo. Quando acabou a filmagem ninguém mais deu bola para ele, todos só pensavam em se ver no vídeo.
Humildemente, o fantasma amarelo pediu uma cópia editada e levou para sua casa e, pela primeira vez na vida, por alguns segundos apenas, pois quase não o filmaram, o fantasma se viu.
E como todo mundo sabe, fantasma que se vê não reaparece.
Foi assim que tudo se resolveu.
terça-feira, 1 de setembro de 2009
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